Escrito por: Joan Pedro

Se for, vá na paz: ‘’Bacurau ‘’ é a resistência popular contra o imperialismo

O Premiadíssimo ‘’Bacurau’’ foi Lançado no Brasil no dia 29 de Agosto deste ano e está em cartaz pela quarta semana, o filme mostra em forma de ficção um retrato sobre os problemas atuais do Brasil e do mundo.

Bacurau/Divulgação
Gravado no RN, filme cumpre papel importantíssimo para os enfrentamentos contra os retrocessos.

O Premiadíssimo ‘’Bacurau’’ foi Lançado no Brasil no dia 29 de Agosto deste ano e está em cartaz pela quarta semana, o filme dos pernambucanos Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles com participações especiais de Sônia Braga (Domingas), Udo Kier (Michael) e Silvero Pereira (Lunga) foi gravado no Rio Grande do Norte, no povoado da Barra (Parelhas/RN) e em Acarí/RN. Apesar da ideia inicial para o roteiro de Bacurau ter sido em 2009, o longa metragem, mostra em forma de ficção um retrato sobre os problemas atuais do Brasil e do mundo, tornando-o uma obra importante para refletir sobre a conjuntura que vivemos. 


Controle da água e as contradições de uma barragem

Logo nos primeiros minutos do filme, Tereza (Barbara Colén) e Erivaldo (Rubens Santos) segue em direção à Bacurau e param o caminhão pipa para observar o bloqueio criado na barragem, que impede que a água chegue até a comunidade. Erivaldo menciona que a Lunga tentou impedir a construção do bloqueio para que a água fosse da população e não dos grandes empresários. No mundo real,  ano após ano, o conflito da água vem aumentando gradualmente em todo o território brasileiro, as principais disputas se dá pelo fato das barragens serem principalmente construídas por empresas privadas. Em um texto publicado em 2011 no portal do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Josivaldo Oliveira afirma que “As empresas precisam de água como matéria-prima para acumular lucro e, para isso, passam a violar mais e mais os direitos humanos” e é isto que Bacurau mostra ao telespectador que o problema da seca não é apenas uma questão climática e sim de ambição, agronegócio, descaso público e totalmente resolvível.


‘’ - Quem nasce em Bacurau é o que?  - É gente! ‘’

Um dia após o enterro de Dona Carmelita (Lia de Itamaracá), Erivaldo chega em Bacurau com o caminhão pipa todo perfurado de bala e logo em seguida, dois forasteiros da região Sul/Sudeste do Brasil chegam a comunidade e chamam à atenção de toda a população, que fica curiosa e desconfiada, porém se mobiliza para recebê-los. Prepotentes, arrogantes e antipáticos os forasteiros representados por Karine Teles (Maria) e Antonio Saboia (João) se tornaram uma representação fictícia do que se tem de pior dos sudestinos com complexo de superioridade e ignorância. Em Bacurau, a estereotipização do sudeste vem para refletir e não difamar. Por muitos anos, o Nordeste é estereotipado de forma bizarra em novelas da Globo, filmes, minisséries e programas de TV, sempre tentaram nos imitar, pressupondo que só existe um único sotaque em toda á região e colocaram a gente num estereotípico rídiculo que nada mais é que xenofobia nos piores níveis. No Sentido em que, arte é pra incomodar e gerar um debate, a obra de Kleber e Juliano dá um ‘’tapa na cara ‘’ naqueles que sempre ridicularizam o nordeste.

Para além disso, Bacurau ainda coloca em discussão sobre como todo brasileiro é visto no exterior. ‘’ Vocês mataram um dos seus ‘’, questiona Michael (Udo Kier) aos forasteiros e João responde que não é um deles, pois ele e Maria vieram da região mais rica do Brasil. Tal afirmação gera uma crise de riso aos estrangeiros presentes na reunião. Para mim, uma das cenas mais geniais do cinema nacional que ficará marcado na história e por muitos anos para conduzir a discussão sobre xenofobia e que ‘’São Paulo é só um Paiol ‘’ como diz o repente do Carranca. Quem nasce em Bacurau é gente, como todo e qualquer nordestino e brasileiro.

Imperialismo e resistência popular

‘’Bacurau é o retrato do Brasil ‘’ estampa as manchetes de diversos jornais brasil afora, inclusive, da aclamada revista ‘’Cahiers dú Cinéma ‘’, talvez, o maior veículo sobre cinema em todo o mundo. Na capa histórica, o Cahiers chama a atenção para as ameaças de Jair Bolsonaro (PSL) com o cinema brasileiro, recentemente, vários militares começaram a ocupar cargos importantes da Agência Nacional de Cinema (Ancine) e não sobra ameaças de censura do presidente brasileiro em relação a conteúdos que aborda um viés ideológico diferente do conservadorismo.

E é neste contexto de ‘’retrato do Brasil ‘’ e de ‘’ uma versão alternativa do presente ‘’ (Cahiers) que a obra traz consigo diversas metáforas das questões geopolíticas atuais. Vamos começar essa análise com o prefeito de Serra Verde, Tony Junior, interpretado pelo ator paraibano Thardelly Lima. Quem já acompanhou, por exemplo, eleições municipais no interior nordestino não deve ter ficado surpreso com a construção do personagem de Tony Jr, o prefeito tem sobrenome que dá a entender ser de alguma família importante da região,  faz ‘’ajuda humanitária ‘’ em período eleitoral visando a reeleição, tem jingles de campanha que faz você pensar naquela música o tempo inteiro. Mais uma vez, Kleber e Juliano acertam no uso de estereótipo sem soar bizarro. Esse político é o da classe dominante daquele território e talvez, uma grande metáfora aos políticos entreguistas que governam o Brasil e que vende nossos patrimônios nacionais ao capital estrangeiro.



Em alguns comentários nas redes sociais, críticos e algumas pessoas que assistiram o filme não gostaram do fato do roteiro de ‘’Bacurau’’ não ter abordado o porque dos estrangeiros começaram à atacar aquela cidade, entretanto, ao meu ver se você não entende o motivo daquelas mortes e de querer apagar a comunidade do mapa, você  entende perfeitamente o processo de dominação política dos países imperialistas em alguns territórios mais subdesenvolvidos. ‘’ Porque vocês estão fazendo isso? ‘’ é a pergunta feita por Domingas (Sônia Braga) ao Michael e pela esposa de Damiano á Kate (Alli Willow) mas essa questão podia ser perguntada, por exemplo ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump sobre o interesse dos EUA em ocupar a Venezuela, ao primeiro ministro de Israel, Bejamim Netanyahu sobre a continuidade dos genocídios aos territórios palestinos e á Emmanuel Macron sobre o porquê da França ainda colonizar territórios africanos em pleno século XXI.  Talvez saibamos as motivações políticas que leva a esses países a fazerem isso, porém, Bacurau, ao ‘’esconder ‘’ o que levou aos estrangeiros atacarem a cidade mostra ao telespectador o quão é banal a interferência imperialista nas soberanias dos povos nos países periféricos.

‘’A visão alternativa do presente ‘’ representada no filme também nos ensina que podemos resistir a esses ataques. Bacurau é a resistência nordestina que derrotou o fascismo ao rejeitar essa política nas urnas e nas ruas. Que possa servir de exemplo para que o restante do Brasil enfrente os retrocessos. 

Assistam Bacurau!

Natal - RN - 16 á 18 de Setembro
Cinemark Midway Mall: 15:20 - 18:30 - 21:30
Cinépolis Natal: 16h - 19h - 21:50

Mossoró/RN - 16 á 18 de Setembro
Multicine - 21h