A ação é motivada pelos graves impactos socioambientais e econômicos decorrentes da instalação de 40 usinas eólicas das quais, 36 já se encontram em funcionamento
Em virtude dos impactos ambientais causados pela instalação de 40 empreendimentos eólicos no município de Serra do Mel/RN, região oeste do estado, a comunidade agrícola de Serra do Mel, instalou ação civil pública e ação coletiva, na última quarta-feira, 21/05, contra as empresas Voltalia Energia do Brasil Ltda e Voltalia S/A.
A ação é movida pela Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Rio Grande do Norte (FETARN), a Central Única dos Trabalhadores do Rio Grande do Norte (CUT/RN) e o Serviço de Assistência Rural e Urbano (SAR).
Na ação é requerida a revisão dos contratos firmados com agricultores familiares, bem como a reparação integral dos danos decorrentes dos impactos causados pelos empreendimentos, além de reconhecimento por dano moral coletivo ambiental que engloba prejuízos à paisagem, à fauna, à saúde e à produção agrícola familiar, também é requerido dano moral aos produtores, relacionado aos efeitos nocivos à saúde dos moradores da comunidade.
Segundo Erivam do Carmo Silva, Presidente da FETARN, “a ação possui grande importância para o Rio Grande do Norte, por tratar da defesa de direitos fundamentais, como o meio ambiente ecologicamente equilibrado, a proteção da saúde e da integridade física e psíquica da população e o reequilíbrio contratual, sobretudo diante da situação de vulnerabilidade dos agricultores familiares diretamente afetados”.
Embora o município tenha se tornado um polo de energia eólica, sua principal atividade econômica, a cajucultura, foi diretamente afetada, assim como os modos de vida e a saúde da população local. Das 40 usinas eólicas em Serra do Mel, 36 já estão em operação.
“Questionamos também o modelo de transição energética adotado, que não pode ser implementado à custa do meio ambiente e dos direitos das comunidades afetadas”, destaca Francisco Irailson Nunes Costa, Presidente da CUT-RN
COMPROMETIMENTO DA SAÚDE
Em relação à saúde da população, desde 2022, dados médicos de Serra do Mel indicam um aumento expressivo nos atendimentos. Os ruídos e vibrações contínuas das turbinas, instaladas próximas às residências, têm causado sintomas compatíveis com a chamada Síndrome da Turbina Eólica, provocando a perda de audição, enxaqueca, tontura, distúrbios do sono e transtornos de ansiedade e pânico. A ação pleiteia o fornecimento de apoio psicológico e médico gratuito às pessoas afetadas pela Síndrome da Turbina Eólica, em razão dos impactos comprovados à saúde.
COMPROMETIMENTO DA FAUNA E DA FLORA
A situação também compromete diretamente a produção agrícola familiar. A poeira gerada pelas obras prejudica a flora local, dificultando a fotossíntese e, consequentemente, a formação dos frutos. A fuga de abelhas impacta diretamente a polinização, especialmente do caju. Além disso, a presença das torres eólicas dentro dos lotes impede o uso adequado de máquinas agrícolas, o que contribui para uma expressiva redução da área cultivável no município.
CONTRATOS ONEROSOS
Outro ponto de destaque na ação é a onerosidade excessiva dos contratos firmados entre a Empresa e os agricultores. Segundo a ação, muitos produtores assinaram contratos de cessão de uso de suas propriedades sem qualquer assistência jurídica adequada, e com a cessão de 100% da propriedade, o que pode descaracterizar o agricultor como "segurado especial", com impactos no seu direito à aposentadoria, além do acesso à crédito.
“A empresa adotou uma estratégia de fracionamento dos empreendimentos e das licenças ambientais, de forma a artificialmente reduzir o porte e o potencial poluidor percebido. Com isso, buscou se eximir da responsabilidade de elaboração do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) para o conjunto dos projetos, documento essencial para a avaliação adequada dos impactos e para a proposição de medidas mitigadoras e compensatórias” pontua Felipe Gomes da Silva Vasconcellos, sócio de LBS Advogadas e Advogados, escritório que representa os autores.
Para o Diácono Francisco Adilson da Silva, coordenador executivo do SAR, “a propositura da ação civil pública busca garantir a transparência e o acesso à informação sobre os impactos dos empreendimentos eólicos na comunidade de Serra do Mel. Ao requerer a elaboração de um EIA/RIMA que englobe todos os projetos e a participação efetiva da comunidade em sua elaboração e na destinação das compensações, reforçamos o direito fundamental à comunicação e à informação, assegurando que o público e os diretamente atingidos tenham conhecimento claro e confiável sobre os riscos e as medidas necessárias”.
SUSPENÇÃO IMEDIATA DE NOVOS EMPREENDIMENTOS
A ação judicial requer, em caráter de urgência, a suspensão imediata da instalação ou operação de novos empreendimentos até que seja elaborado um Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) abrangente, com efetiva participação da comunidade local. Solicita-se que esse EIA/RIMA seja concluído no prazo de 90 dias. Além disso, exige-se o cumprimento de uma distância mínima de dois mil metros, ou dez vezes a altura total do aerogerador (incluindo as pás), entre as turbinas e as residências mais próximas, aplicando-se essa regra especialmente às usinas que ainda não foram implantadas ou que se encontram inoperantes.
Em relação às turbinas já instaladas e em funcionamento, a ação requer a realocação para uma distância segura, mantendo-se o parâmetro mínimo de dois mil metros ou dez vezes a altura do aerogerador, assegurando, entretanto, que a remuneração dos agricultores afetados seja preservada, com base na capacidade instalada originalmente contratada. A demanda busca a condenação das rés ao pagamento de indenização à comunidade pelos danos morais coletivos de natureza ambiental.